segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

entrevista com Santiago parte I

foto: Josiane Picada

Ótima entrevista em que esse grande cara fala de sua carreira, censura, relações inprensa/anunciantes e, acima de tudo mostra por que é tão respeitado: "O que me orgulha é não ter transigido (...). eu não vou fazer jogo com chefes de redação dos grandes jornais (...) só sei trabalhar com entusiasmo, não posso fazer desenhos negociados, que não brotem do meu entusiasmo ou da minha indignação com os fatos políticos".

JB- Já foste muito censurado em teu trabalho?

Santiago - Sim. Eu conheço a censura de perto há muito tempo. Eu comecei o jornalismo em 1975, quando o censor externo, o policial, já havia se retirado. Mas também conheci de perto a censura das próprias empresas. Mesmo na Folha da Tarde houve vários impedimentos, muitos deles relacionados a anunciantes. E isso é maior hoje, o anunciante manda muito mais hoje do que mandava naquela época. Eu sempre digo que não existe liberdade de imprensa no Brasil, porque não existe colunista de esquerda, aliás só tem um que se chama Luiz Fernando Veríssimo. Ou eles são centrista ou de direita. Na imprensa, os que estão em cima do muro têm emprego garantido. Se tu fores de direita, é ótimo, tipo Rogério Mendelski. Não vai faltar emprego para ele. Mas os jornais gostam de fazer aquela onda de que estão criando controvérsia, tão criando o contraditório. Um exemplo, é o Chávez da Venezuela, não é possível que não tenha no Brasil alguém que seja a favor do Chávez e que dê uma entrevista defendendo as posturas dele. Mas não, o que tem é um bloco uníssono dizendo que o cara é um ditador. Então é uma demonstração bem clara de que aqui a imprensa é propagandística. Um dos desenhos que aumentou a crise no Jornal do Comércio foi em que eu pedia o contraditório em relação à Venezuela. Como é que o leitor vai formar uma opinião se ele só está vendo o contra? Ele fica perdido. Então, eu fiz um desenho pedindo o contraditório e um leitor identificado com a extrema direita "pediu a minha cabeça", alegando que o capitalismo tinha dogmas que não podiam ser contestados e discutidos. E que eu não tinha que pedir o contraditório em relação ao Chávez, pois ele foi decretado que era um bandido e não tem como alguém dizer o contrário

JB - Tu és de esquerda?

Santiago - Acho que sim. A gente até nem sabe mais o que é ser de esquerda, mas essa postura de inconformismo, de tu criticares e pedir uma sociedade mais justa, é uma postura de esquerda. Pedir uma sociedade solidária, distribuição de renda mais justa, é uma obrigação da gente. É uma forma de ser de esquerda, inconformista. Pedir para se sair dessa concentração de renda vergonhosa no Brasil é uma obrigação. Eu digo sempre que o jornalista, o humorista e o chargista vivem de abraçar boas causas. E abraçar boas causas são as causas humanitárias e a causa humanitária mais urgente é a distribuição de renda. Ela é o caminho do socialismo.

JB - Existe alguma coisa de que tu te arrependas e alguma coisa de que tu te orgulhes muito?

Santiago - Eu sou que nem Édith Piaf, não me arrependo de nada. Estou brincando (risos). Mas me arrepender de quê? Eu sempre caminhei pelo caminho da espontaneidade, sempre fui tomando decisões aqui e ali. Acho que não me arrependo de nada. Não sei se eu deveria ter saído de Porto Alegre e ter ido procurar um campo mais propício para trabalhar. A gente aqui é muito maltratado. Talvez eu me arrependa de não ter saído na hora exata. Não digo que eu deveria ter ido para o Rio, ou São Paulo, porque lá é a mesma imprensa dos negócios. Acho que para sair tem que ser para fora do país, para encontrar uma imprensa um pouquinho mais saudável, mais arejada. E o que me orgulha é não ter transigido com essas coisas, não ter feito esse jogo que fazem no jornalismo, amizade por conveniência. Eu não vou fazer jogo com chefes de redação dos grandes jornais. Porque é um jogo difícil de fazer, para atingir um público grande tu vai ter que fazer uma série de transigência. E eu só sei trabalhar com entusiasmo, não posso fazer desenhos negociados, que não brotem do meu entusiasmo, ou da minha indignação com os fatos políticos. Não tem como não trabalhar com essa paixão.

Um comentário:

Anônimo disse...

Boa entrevista. Vou aguardar a parte II.
Ronaldo - Porto Alegre