segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

entrevista com Santiago parte II

JB - Já teve alguma empresa que tu recusaste em função dessas convicções?

Santiago - Não, porque eles não me procuram (risos), nunca criei esse dilema. Mas eu tive uma experiência com o Estado de São Paulo. Foi uma coisa marcante porque foi no início do governo Collor. Eu tive nove meses com eles, ao fim dos nove meses eles cortavam muita coisa, daí eu disse que ia embora. Um jornal de circulação como esse, te faz conhecido no país inteiro, mas tu te torna conhecido como um desenhista brincalhão, engraçadinho, um bobo-alegre. Então, eu não quero ficar conhecido como um bobo-alegre. Se eu não posso mostrar a minha verdadeira cara, de ser crítico, de ter uma certa acidez na crítica à política, então, eu prefiro não ser conhecido.


JB - Fale um pouco do Jornal do Comércio?

Santiago- Durante cinco anos, eu Kaiser e Moa fizemos desenhos que foram bons desenhos. Eu acho que ninguém fez panfleto. Acho que nós fizemos coisas com humor, com graça e com crítica. Eu não abro mão de fazer um desenho com graça, com crítica. Se o desenho tiver só crítica e não tiver graça, não tem valor nenhum. Se tiver crítica tem que ter graça, humor, senão vira panfleto xarope. Nós começamos a notar já no governo Rigotto que as coisas iam ser difíceis. Não é para falar do governador, nem de bem, nem de mal, era a orientação. E como eles sabiam que a gente não ia falar de bem... Porque o humor não fala de bem, o humor trabalha com crítica. Não existe o humor a favor de nada. É aquele velho lema latino: rindo, castigas a moral. A gente fala das coisa que estão andando mal no mundo. Quando chegou o governo Yeda, a gente entendeu que seria a mesma coisa. Parece que o dono do jornal é amigo dos dois. Então como estamos na província das províncias, o jogo vai ser difícil e não deu outra. O problema do Jornal do Comércio é que o dono é um camarada que fez fortuna no comércio e resolveu entrar no ramo do jornalismo. Mas o cara não entende nada de jornalismo, não sabe que o jornalismo precisa de um mínimo de contraditório, que é bom, que é saudável para o jornal dele o contraditório. E nada melhor do que ter uma charge que fale desse contraditório, de uma forma humorada. Seria perfeito para ele, as pessoas iam dizer: bah, como esse cara é democrata! O jornal dele tem um desenhista que critica o sistema e tal. Seria uma bela imagem de democrata, mas infelizmente o cara optou por manter a imagem do comerciante, de vendedor de material de construção e de torneira.

JB - Qual a tua opinião sobre a Zero Hora?

Santiago - Eu costumo dizer que a ZH é um jornal muito curioso. É o único jornal que já se atribui nota na capa: zero. É o jornal cuja edição dominical é feita na sexta, com as notícias de quinta, circulando no sábado e mentindo que é de domingo. É uma página dez que nunca está na página dez e tem um desenhista que não sabe desenhar. Essa é a ZH pra mim. É um jornalismo, aliás, como todo o que se faz no país, mais preocupado com os negócios, do que com a notícia.


fonte: João de Barro jan/08 - jornal da Associação do Pessoal da Caixa (APCEF/RS)


Nenhum comentário: