DIRETO DE CARACAS
Ex-chefe de reportagem da RCTV acusa rede de articular golpe
Atual presidente da Telesur demitiu-se da emissora em meio ao golpe de Estado de 2002. Para ele, construir a nova emissora do Estado é o maior desafio do governo Chávez.
Gilberto Maringoni – Carta Maior
CARACAS - Andres Izarra protagonizou um dos mais dramáticos episódios do golpe de 11 de abril de 2002, na Venezuela. Ao perceber o cerco midiático que a Rede Caracas de Televisión (RCTV), da qual era chefe de reportagem, protagonizava, juntamente com outros canais privados, pediu demissão em plena crise institucional. Denunciou a articulação entre os meios de comunicação privados e os golpistas. Com a volta de Chávez ao poder, foi nomeado, meses depois, ministro das Comunicações. Agora, como presidente da Telesur, o canal internacional patrocinado pelos governos da Venezuela, de Cuba, da Argentina e do Uruguai, Izarra faz planos para expandir o alcance da rede. Na tarde da sexta-feira, 15, Andres Izarra concedeu a seguinte entrevista à Carta Maior, na sede da emissora, em Caracas.
Carta Maior – O que motivou a não renovação da concessão da RCTV?
Andres Izarra – Naqueles dias de abril de 2002, a RCTV mostrou-se como uma grande estruturadora, articuladora, incentivadora e propulsora do golpe de Estado. Defendeu as posições das câmaras empresariais e se colocou como instrumento do blecaute informativo sobre o que ocorria quando o povo foi às ruas exigir o respeito à democracia. Além disso, tornou-se peça chave do que ficou conhecido como um golpe continuado, com distintos capítulos, à medida em que a conjuntura evoluía.
CM – Como assim?
Izarra – Eles participaram do golpe de abril, do paro petroleiro, entre fins de 2002 e começo de 2003, e participaram das guarimbas, que foram manifestações violentas nas ruas. Além disso, conjuntamente com outros canais privados, deixaram de veicular publicidade e passaram a transmitir dezenas de chamadas durante 64 dias, destinadas a desestabilizar o país e provocar um golpe. Esses spots eram da Coordenadoria Democrática [coalizão dos partidos de oposição] e visavam criar uma situação de terrorismo psicológico. Estes tipos de ações seriam inconcebíveis em qualquer outro país. Isso só existe quando há um governo extremamente tolerante e democrático, como o da Venezuela. Chegaram ao cúmulo de transmitir pronunciamentos de militares uniformizados e armados chamando à sublevação e ao não reconhecimento do governo nacional. Agora abraçam o discurso da liberdade de expressão, como se ela não existisse. A RCTV tem todos os seus equipamentos conservados intactos e podem transmitir por cabo o que quiserem.
CM – Por que apenas a RCTV não tem sua concessão renovada, se os outros canais privados também se envolveram no golpe?
Izarra –A Venevisión, a Televén são canais que, depois do referendo [de agosto de 2004], resolveram deixar de fazer política e fazer televisão. Não estou dizendo que se autocensuraram. O canal 10, por exemplo, segue crítico ao governo. Mas eu não sou ministro de Comunicações, sou diretor de um canal. Ele pode lhe responder sobre isso [Carta Maior tentou marcar uma entrevista com William Lara, Ministro das Comunicações, mas não conseguiu].
CM – Por que há tanta repercussão sobre este episódio da RCTV no plano internacional?
Izarra – Há uma campanha. O problema é que o exemplo dado pela Venezuela, mostra que este conglomerado de meios de comunicação não pode impor tudo o que quer. Os donos desses meios, associados à Sociedade Innteramericana de Prensa (SIP), têm a seguinte doutrina: o espaço público é privado e a concessão dura para sempre. Eles precisam saber que aqui não há nada acima do Estado e que na Venezuela se cumpre a lei. O receio é que este exemplo de soberania dado pela Venezuela se multiplique por outros países, nos quais os meios cometem tantos abusos como aqui.
CM – Já houve situações semelhantes, antes do governo Chávez, em relação aos meios de comunicação?
Izarra - O comportamento da RCTV não é novidade. Em 1976, durante o governo de Carlos Andrés Pérez, a lei determinou a suspensão das transmissões por três dias, por difundir notícias falsas e tendenciosas. Em 1980, a RCTV foi fechada por 36 horas por sensacionalismo, no governo de Luís Herrera Campins. Um ano depois, foi suspensa 24 horas, acusada de veicular programação pornográfica. Isso se repetiu em 1984, por ridicularizar o mesmo presidente. Em 1989, a lei determinou nova suspensão, por transmitir publicidade de tabaco. Em 1991, um programa foi tirado do ar, no segundo governo Pérez. Isso não foi no governo Chávez!
CM – O senhor pediu demissão da chefia de reportagem da RCTV no dia seguinte ao golpe de Estado de 2002. Como foi isso?
Izarra – Havia instruções diretas: zero de chavismo na tela e nada relacionado ao governo podia ir ao ar. Havia pressão direta. Quando eu saí, denunciando essas práticas, ninguém falou que era censura, ninguém se solidarizou, nem sindicatos, nem a SIP, nem os Repórteres Sem Fronteiras, nem a Federação Internacional de Jornalistas e nem ninguém. Isso diz muito sobre quem é essa gente. Hipócritas! Falsos! Medíocres! Baratos! Para mim, não merecem nenhum respeito.
CM – Como estão as perspectivas de Telesur?
Izarra – A Nicarágua acaba de se incorporar à rede e esperamos que o Equador também venha. Continuamos crescendo muito, pois há bastante demanda. Vamos lançar agora o sinal em português, juntamente com o governo do Paraná. O governador Roberto Requião tem sido um entusiasta da Telesur e um aliado importante e estratégico. Nosso sinal é aberto e gratuito a quem queira retransmití-lo. Em setembro, nosso sinal chegará a Europa. E estamos incrementando produções locais em cada país, além da rede de correspondentes. Já temos sucursais nos Estados Unidos, México, Cuba, Nicarágua, Peru, Equador, Colômbia, Bolívia, Brasil, Buenos Aires, Uruguais, entre outras. Temos também muitas dificuldades por sermos um canal anti-hegemônico. Somos como a Al-Jazira, que nas invasões do Afeganistão e Iraque mostrava o ponto de vista dos bombardeados e não dos que lançavam as bombas. Acabo de regressar do Equador, onde uma equipe nossa foi ameaçada de morte. Há um ano, nosso correspndente na Colômbia foi preso, injustamente acusado de estar ligado aos narcotraficantes. As redes de distribuição a cabo tentam nos impedir de crescer. Os monopólios Televisa, no México, Clarín, na Argentina, Globo, no Brasil, entre outros, nunca cederão espaço a Telesur.
CM – A nova rede, a TVes fará parte da rede Telesur?
Izarra – Não. Penso que TVes, a nova televisão de serviço público, é o maior desafio deste governo. É um projeto em construção. É prematuro avaliar seus resultados, pois levará um tempo até ser abraçada pelo público, sobretudo quando se pensa numa programação distinta da existente, evitando-se colocar lixo no ar. Não é difícil fazer uma televisão melhor que a RCTV. Ao mesmo tempo não será fácil fazer uma emissora popular realmente de qualidade.
Carta Maior – O que motivou a não renovação da concessão da RCTV?
Andres Izarra – Naqueles dias de abril de 2002, a RCTV mostrou-se como uma grande estruturadora, articuladora, incentivadora e propulsora do golpe de Estado. Defendeu as posições das câmaras empresariais e se colocou como instrumento do blecaute informativo sobre o que ocorria quando o povo foi às ruas exigir o respeito à democracia. Além disso, tornou-se peça chave do que ficou conhecido como um golpe continuado, com distintos capítulos, à medida em que a conjuntura evoluía.
CM – Como assim?
Izarra – Eles participaram do golpe de abril, do paro petroleiro, entre fins de 2002 e começo de 2003, e participaram das guarimbas, que foram manifestações violentas nas ruas. Além disso, conjuntamente com outros canais privados, deixaram de veicular publicidade e passaram a transmitir dezenas de chamadas durante 64 dias, destinadas a desestabilizar o país e provocar um golpe. Esses spots eram da Coordenadoria Democrática [coalizão dos partidos de oposição] e visavam criar uma situação de terrorismo psicológico. Estes tipos de ações seriam inconcebíveis em qualquer outro país. Isso só existe quando há um governo extremamente tolerante e democrático, como o da Venezuela. Chegaram ao cúmulo de transmitir pronunciamentos de militares uniformizados e armados chamando à sublevação e ao não reconhecimento do governo nacional. Agora abraçam o discurso da liberdade de expressão, como se ela não existisse. A RCTV tem todos os seus equipamentos conservados intactos e podem transmitir por cabo o que quiserem.
CM – Por que apenas a RCTV não tem sua concessão renovada, se os outros canais privados também se envolveram no golpe?
Izarra –A Venevisión, a Televén são canais que, depois do referendo [de agosto de 2004], resolveram deixar de fazer política e fazer televisão. Não estou dizendo que se autocensuraram. O canal 10, por exemplo, segue crítico ao governo. Mas eu não sou ministro de Comunicações, sou diretor de um canal. Ele pode lhe responder sobre isso [Carta Maior tentou marcar uma entrevista com William Lara, Ministro das Comunicações, mas não conseguiu].
CM – Por que há tanta repercussão sobre este episódio da RCTV no plano internacional?
Izarra – Há uma campanha. O problema é que o exemplo dado pela Venezuela, mostra que este conglomerado de meios de comunicação não pode impor tudo o que quer. Os donos desses meios, associados à Sociedade Innteramericana de Prensa (SIP), têm a seguinte doutrina: o espaço público é privado e a concessão dura para sempre. Eles precisam saber que aqui não há nada acima do Estado e que na Venezuela se cumpre a lei. O receio é que este exemplo de soberania dado pela Venezuela se multiplique por outros países, nos quais os meios cometem tantos abusos como aqui.
CM – Já houve situações semelhantes, antes do governo Chávez, em relação aos meios de comunicação?
Izarra - O comportamento da RCTV não é novidade. Em 1976, durante o governo de Carlos Andrés Pérez, a lei determinou a suspensão das transmissões por três dias, por difundir notícias falsas e tendenciosas. Em 1980, a RCTV foi fechada por 36 horas por sensacionalismo, no governo de Luís Herrera Campins. Um ano depois, foi suspensa 24 horas, acusada de veicular programação pornográfica. Isso se repetiu em 1984, por ridicularizar o mesmo presidente. Em 1989, a lei determinou nova suspensão, por transmitir publicidade de tabaco. Em 1991, um programa foi tirado do ar, no segundo governo Pérez. Isso não foi no governo Chávez!
CM – O senhor pediu demissão da chefia de reportagem da RCTV no dia seguinte ao golpe de Estado de 2002. Como foi isso?
Izarra – Havia instruções diretas: zero de chavismo na tela e nada relacionado ao governo podia ir ao ar. Havia pressão direta. Quando eu saí, denunciando essas práticas, ninguém falou que era censura, ninguém se solidarizou, nem sindicatos, nem a SIP, nem os Repórteres Sem Fronteiras, nem a Federação Internacional de Jornalistas e nem ninguém. Isso diz muito sobre quem é essa gente. Hipócritas! Falsos! Medíocres! Baratos! Para mim, não merecem nenhum respeito.
CM – Como estão as perspectivas de Telesur?
Izarra – A Nicarágua acaba de se incorporar à rede e esperamos que o Equador também venha. Continuamos crescendo muito, pois há bastante demanda. Vamos lançar agora o sinal em português, juntamente com o governo do Paraná. O governador Roberto Requião tem sido um entusiasta da Telesur e um aliado importante e estratégico. Nosso sinal é aberto e gratuito a quem queira retransmití-lo. Em setembro, nosso sinal chegará a Europa. E estamos incrementando produções locais em cada país, além da rede de correspondentes. Já temos sucursais nos Estados Unidos, México, Cuba, Nicarágua, Peru, Equador, Colômbia, Bolívia, Brasil, Buenos Aires, Uruguais, entre outras. Temos também muitas dificuldades por sermos um canal anti-hegemônico. Somos como a Al-Jazira, que nas invasões do Afeganistão e Iraque mostrava o ponto de vista dos bombardeados e não dos que lançavam as bombas. Acabo de regressar do Equador, onde uma equipe nossa foi ameaçada de morte. Há um ano, nosso correspndente na Colômbia foi preso, injustamente acusado de estar ligado aos narcotraficantes. As redes de distribuição a cabo tentam nos impedir de crescer. Os monopólios Televisa, no México, Clarín, na Argentina, Globo, no Brasil, entre outros, nunca cederão espaço a Telesur.
CM – A nova rede, a TVes fará parte da rede Telesur?
Izarra – Não. Penso que TVes, a nova televisão de serviço público, é o maior desafio deste governo. É um projeto em construção. É prematuro avaliar seus resultados, pois levará um tempo até ser abraçada pelo público, sobretudo quando se pensa numa programação distinta da existente, evitando-se colocar lixo no ar. Não é difícil fazer uma televisão melhor que a RCTV. Ao mesmo tempo não será fácil fazer uma emissora popular realmente de qualidade.
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